sábado, 24 de agosto de 2024

Por mais que uma determinada experiência esteja no passado distante, certas coisas não mudam e as lembranças são vívidas. Tal lei percebida nas relações humanas provoca um turbilhão de sensações na mente de Luizinho: “Há tempos não a vejo. Ela está mais bonita!”.

Mergulhado numa série de divagações, Luizinho estava no meio da multidão; a música alta, por sinal de péssima qualidade, não atrapalhava as suas reflexões. O sereno cessou. O frio era suportável. Bandeirolas “fatiavam” a Lua. No semblante coletivo, a alegria era geral, afinal, a epifania joanina fervilhava.

– Olá, Taís! Como está? Quanto tempo!

– Olá, Luizinho! Realmente. Estou bem! E você?

– Ótimo! Melhor agora que estou te vendo. – “Poxa! Minha resposta foi bem clichê. Tudo bem. Bola pra frente...”

– Você ainda mora aqui?

– Moro sim. Pelas redes sociais, sei que você mora naquela cidade babilônica.

– Já faz tempo que moro lá. Estou trabalhando na esfera pública.

– Digamos que você é uma burocrata – comenta Luizinho com um tom despojado.

– Mais ou menos – risos.

– Eu trabalho aqui nesta cidade amarga.

– Luizinho, você continua com aquele senso de humor. Adorava conversar contigo.

– Querida, fico feliz com vossa percepção sobre mim.

– Tenho uma doce saudade daquela época.

– Eu também! Nós éramos adolescentes; estávamos na “flor da idade”.

– Nosso encontro foi muito rápido.

– Sim. As circunstâncias abreviaram a nossa extensão temporal – argumenta Luizinho.

– Pelo visto, a verve filosófica permanece em ti.

– Um pouquinho.

– Conte-me mais sobre você. Você já se casou?

– Felizmente ou infelizmente, não. Estou longe do casamento: ninguém me quer.

– Não seja modesto. Você é um homem bonito!

­– Obrigado – bochechas avermelhadas.

– Por nada!

– E você já se casou?

Após tal pergunta, houve um “silêncio ensurdecedor”. A consciência de Luizinho pode ouvir a música horrenda que estava sendo tocada. De forma categórica, Taís ficou um pouco desconcertada e a harmonia do diálogo atingiu um tom dissonante. Percebendo tamanho desconforto, Luizinho apelou para o seu senso de humor:

– Detesto esse “sertanejo universitário”. As músicas e os cantores são todos iguais. Tudo repetitivo e massificado.

– Às vezes, tenho essa percepção também.

Luizinho regressa ao plano reflexivo: “Taís ficou visivelmente sem graça com a pergunta do casamento. Não tive culpa: apenas devolvi a pergunta que ela fez. Aparentemente, ela irradia uma energia positiva para mim. A reciprocidade é explícita e o olhar dela é revelador. E esse batom vermelho só instiga, como diria o Engenheiros do Hawaii, ‘os meus instintos mais sacanas’...”

– Pois é, Taís, depois de tanto tempo nos reencontramos, justamente em meio a este caos.

– Exato, Luizinho. A vida é surpreendente!

– Certas coisas, ou a maioria das coisas, fogem do nosso controle.

– Este é o sabor da vida: a imprevisibilidade.

– Celebremos a vida! Aceitaria um licor?

– Qual sabor? – questiona Taís.

– Morango. Autoria de um amigo de velhas datas.

– Vou experimentar.

– Pronto. Desfrute!

– Maravilhoso! Nota 10!

Ilustre Leitor, permita que o eu lírico participe desta crônica que compõe o universo literário de Santos Pecados da Carne. Não sei o porquê, talvez eu saiba, a conversa entre Luizinho e Taís angariou uma roupagem mais descontraída. Os sorrisos espelhavam grandes doses de alegria. Os jovens estavam tão absorvidos entre si que ficaram alheios perante o mundo ao seu redor. Não existia frio. Não existia música canhestra. Não existiam adornos joaninos. Não existiam amigos e amigas. Naquele presente instante, só Taís existia para Luizinho e vice-versa. Doravante, Caro Leitor, o eu lírico não atrapalhará mais a dinâmica da crônica com os seus comentários alicerçados em idiossincrasias.

Conjuntamente aos minutos, algumas doses de licor se passaram. Apesar da influência inequívoca da Indústria Cultural, o espírito joanino persiste, sobretudo nas canções do Grandioso Luiz Gonzaga que não cessam de ser entoadas, por conseguinte, a tradição do São João jamais será dissipada. Voltemos ao mote da crônica. Defronte a mutação sonora, os corpos dos protagonistas acompanham o ritmo musical. Luizinho pensou: “As curvas de Taís estão arrepiando as minhas entranhas. Que mulher deliciosa! Pena que na época que nos encontramos não passamos dos beijos e abraços...”. Palavras ao ouvido:

– Você dança muito bem!

– Nem tanto.

– Acredite! – Taís fala com ênfase.

– Está bem.

– Não nego para você que a noite está sendo muito agradável.

– Concordo plenamente contigo, Gata!

–  A distância temporal e as circunstâncias não apagaram as nossas lembranças.

– Saiba que a recíproca é verdadeira.

– Enfim, uma noite muito boa.

Num tom misterioso e enfático, Luizinho replica:

– Invertendo a Lei de Murphy: nada está bom que não possa melhorar...

– Hum...

Subsequente a um breve pensamento, Taís retoma o diálogo:

– Analisando bem... Você está certo. Pensemos assim!

– Ótimo, Gata!

– Evoluir... Evoluir... Evoluir... Eis o lema da vida!

– Taís, a propósito, teu corpo é maravilhoso!

– Fico feliz, Gato! Saiba que estou adorando sentir novamente o teu calor.

– Taís, perdão pela franqueza: você é muito gostosa!

– Como é que você sabe? – risos.

– Não preciso ser um gênio para atestar o óbvio: você é muito gostosa!

– Luizinho, Meu Amor, por que você está tão convicto? Você ainda não o provou.

– Ainda?

– Ainda.

– Ainda?

– Ainda não.

– Hum...

Taís dispara outro questionamento:

– Por que não?

– Isso, Gata!

– Por que não? Por que não...

– Por que não?!

– Amor, você deseja comprovar a tua afirmação?

– Qual afirmação?

– Se eu sou mesmo muito gostosa.

– Nossa, Gata! É o que eu mais quero...

– Gato, não esqueça, só temos o hoje. O futuro não nos pertence. Amanhã, cada um seguirá o seu caminho.

– Você está certa. Tenho consciência de tua condição. Não haverá amanhã!

– Não haverá amanhã!

– Ótimo!

– Fico aliviada com vossa compreensão.

– Vivamos o instante como se fosse uma experiência eterna. Esqueçamos o passado e o futuro.

– Vivamos o presente! Sem delongas, desejo fervorosamente que você tenha a experiência para provar se sou gostosa.

– Será uma experiência inesquecível!

– Quero que você me observe, me cheire, me toque e possua o meu corpo – afirma Taís de forma sensual.

– Ótimo, Gata! Irei me esbaldar no teu corpo.

– Meu corpo será teu objeto de estudo. Desfrute intensamente de cada parte dele.

– Combinado, Minha Gostosa!

– Onde fica o laboratório? – indagação seguida de risos.

– Vamos para lá agora mesmo...

 

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