Na tranquilidade do sono, em pleno território de Morfeu, uma
nuvem densa suscita, dissipando-se de forma fugaz. Ambiente sereno e claridade
opaca. Três paredes vistas pelo inconsciente.
Mesa de madeira com seis cadeiras desocupadas. Eis algumas imagens de
lembranças de outrora. No nosso itinerário existencial, tudo tem um propósito e
cada peça no tabuleiro tem o seu significado; precisamos ter perspicácia para
interpretar as mensagens contidas nos símbolos.
Os frames oníricos prosseguem. A cadeira direita da
cabeceira é ocupada. Asas angelicais se abrem e revelam um semblante calmo e
feliz; observa-se poucas rugas e óculos. Vestes em tom claro. Cajado recostado
na mesa. O Patriarca direciona o olhar para o protagonista do sonho;
este último, acometido por uma abissal e doce saudade. Por mais que o corpo
esteja adormecido, reações químicas geram um frenesi no mundo do inconsciente.
O Protagonista e o Patriarca compartilham do
mesmo nome; sobrenome do avô vivo no neto. Nos derradeiros dias, as notas de Avôhai foram ouvidas incessantemente;
versos do genial Zé Ramalho ecoaram no inconsciente.
Recordações são replicadas, gerando no ego o regresso ao passado. O tão
aguardado reencontro, novamente, é consumado. Apesar da grandiosidade de tal
evento, a serenidade se fez presente. A leveza de espírito emana no sonho.
Vovô, por que tu partiste? Fazes muita falta. Saiba que és a
minha principal referência intelectual e moral. Vossos ensinamentos norteiam a
minha caminhada e tu estás vivo no meu âmago. Sempre te trarei comigo até o fim
dos meus dias. Teu corpo perdeu a energia vital, porém teu espírito habita nos
corações daqueles que te amaram. Meu Velho, o insensível tempo não será capaz
de apagar o amor que tenho por ti. Prezado Leitor, perdoe-me pelo lampejo
subjetivo!
Voltemos à dimensão onírica. Lábios se mexem, mas o silêncio
persiste. O Protagonista tenta ouvir a mensagem. Apesar do monólogo
onírico, a angústia inexiste no receptor. Em certas ocasiões, a compreensão do
que é falado não é condição primordial. Insofismavelmente, sentir é uma
experiência mais profunda do que o entendimento. Às vezes, nós ficamos
preocupados em compreender o mundo num ângulo racional e esquecemos o quão a sensação
é algo marcante e inefável. O fato é que necessitamos ter uma relação mais sensitiva
com o mundo que nos cerca.
Apesar da explanação final do parágrafo acima, não podemos
prescindir do ato de compreender. A experiência onírica é simbólica, por
conseguinte, é imprescindível ter mecanismos para interpretá-la. Enfim, posterior
ao monólogo, o olhar do Protagonista efetua um movimento de 180 graus,
emergindo uma nuvem que flui para o corredor. Uma porta é aberta. Império de cores
claras. Mãos aos olhos. Fusão de saudade e catarse espiritual. O corpo
desperta. Travesseiro cheio de lágrimas…
(Tosta Neto, 30/05/2024)
0 comments: