quarta-feira, 4 de novembro de 2020

CASO MARIANA FERRER: TESE DE 'ESTUPRO CULPOSO' E HUMILHAÇÃO DA VÍTIMA GERAM REVOLTA

O empresário André de Camargo Aranha foi acusado de estuprar a influenciadora digital Mariana Ferrer durante uma festa em Florianópolis em 2018. Apesar de uma prova pericial do crime, ele acabou absolvido em primeira instância. 

Na sentença divulgada em setembro deste ano, o juiz concordou com a posição do Ministério Público, que concluiu que o acusado não teve a intenção de estuprar. Além da tese de 'estupro culposo', teve grande repercussão nas redes sociais a forma como a vítima foi tratada no julgamento. O advogado do réu chegou a exibir fotos sensuais de Mariana para defender seu cliente e ainda a ofendeu com palavras.

Imagens da audiência do caso de estupro de Mari Ferrer foram divulgadas pelo The Intercept Brasil nesta terça-feira (3). Os trechos divulgados repercutiram, causaram revolta e deixaram o assunto entre os assuntos mais comentados nas redes sociais. Na ocasião, o empresário André de Camargo Aranha era julgado pelo estupro da jovem em uma festa que ocorreu em 2018. No entendimento no promotor do caso, não havia como Aranha saber, durante o ato sexual, que a vítima não estava em condições de consentir a relação, não existindo assim “intenção” de estuprar.

 

A tese apresentada pelo promotor e acatada pelo juiz, todos homens, não tem precedentes na Justiça brasileira. Exatamente a inexistência de um crime não previsto em lei é que embasou o argumento e acabou em absolvição do empresário.

 

“Chocante. A sentença traz uma postura inovadora. Traz a figura do estupro culposo, e a absolvição com base em não existir o estupro culposo. De fato, não existe um modo culposo de estupro”, reconheceu. Em seguida ela explica que o estupro é a violência sexual, qualquer ato sexual feito sobre grave ameaça. No caso de Mari Ferrer a tipificação deveria ser, e foi a princípio, como estupro de vulnerável, em que a vítima não tinha condição de dar o seu consentimento.

 

No vídeo a que o The Intercept teve acesso, o advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho, contratado por André de Camargo Aranha para defendê-lo, ataca a vítima e utiliza fotos de Mariana fora de contexto. Ele apresenta fotos sensuais dela e chega a classificar as imagens como “ginecológicas”. Em momento algum foi questionado por membros do Tribunal de Justiça catarinense sobre a relação das fotos com o caso. Em outro momento da audiência, o advogado de Aranha afirma que “jamais teria uma filha” do “nível” de Mariana. Ele também repreende o choro dela: “não adianta vir com esse teu choro dissimulado, falso e essa lábia de crocodilo”.

 

Em outro momento, o advogado insinua que Mariana tem como "ganha pão" a "desgraça dos outros".

 

A conduta de Gastão se mostra como “um evidente abuso do poder de defesa” para a advogada baiana. “O advogado do agressor é extremamente violento, misógino, e acaba por violentar a vítima. E dá para perceber no vídeo que aquela situação é consentida inclusive pelo juiz”, lamenta. 

 

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) vai analisar um pedido de investigação contra o juiz Rudson Marcos que inocentou o empresário. O pedido de investigação contra o magistrado foi apresentado pelo conselheiro do CNJ Henrique Ávila à corregedoria do órgão. Ávila quer que sejam averiguadas responsabilidades do magistrado na condução da audiência por meio da abertura de uma reclamação disciplinar. A proposta deve ser apreciada pelo plenário do Conselho. 

 

O plenário do Senado Federal aprovou nesta terça-feira, por unanimidade, voto de repúdio ao promotor Thiago Carriço, ao advogado Cláudio Gastão da Rosa Filho e ao juiz Rudson Marcos por causa do caso de humilhação a Mariana Ferrer.

 

O voto foi apresentado pelo senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que também entrou com representação contra o juiz do caso no CNJ e contra o promotor no Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O mesmo será feito contra o advogado do caso na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

 

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, utilizou as redes sociais para criticar a sentença. “As cenas da audiência de Mariana Ferrer são estarrecedoras”, escreveu o ministro.  “O sistema de Justiça deve ser instrumento de acolhimento, jamais de tortura e humilhação. Os órgãos de correição devem apurar a responsabilidade dos agentes envolvidos, inclusive daqueles que se omitiram”, defende Gilmar. 

 

O caso repercutiu também entre famosos. A atriz Bruna Marquezine publicou a matéria do caso e lamentou. "'Estupro culposo', pqp", escreveu. Enquanto a cantora Iza afirmou que “'Estupro culposo' não existe". A atriz Deborah Secco usou as redes sociais para pedir "Justiça por Mariana Ferrer". Anitta usou o Twitter para mandar uma mensagem para a vítima: "Mariana Ferrer, eu admiro sua coragem de uma forma que você nem imagina”.


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