–
Venha, Filho! Abrace-me.
–
Que saudade da senhora! Meu pai e Amanda estão em casa?
–
Tua irmã está na escola. Joaquim, no trabalho.
–
Mãe, terei um mês de recesso do seminário.
–
Ótimo, Filho! Aproveitaremos ao máximo a tua presença.
–
Agora, “matarei” a saudade do meu quarto.
–
Vá. Arrumei-o com muito carinho.
–
Obrigado, Dona Isabel!
–
Por nada.
Lucas
enveredou para o quarto. Desfez a mala, organizou as roupas e acendeu uma vela
para Santa Mônica. Ele estava no terceiro ano do seminário. A realização do sonho
sacerdotal regozijaria os familiares, sobretudo os avós maternos. Lucas nasceu
e foi criado numa fervorosa família católica do interior da Bahia. Desde
pequeno, a sua devoção a Deus despertara a atenção de todos. Lia diariamente a Bíblia e não perdia a missa dominical. O
sacerdócio seria algo natural.
–
Bom dia, Filho! Como você passou a noite?
–
Maravilhosamente bem. Graças a Deus! E a senhora?
–
Bem. Ah, amanhã receberemos uma visita. Tua prima Jéssica vem para cá passar uns
15 dias. Tua irmã está ansiosa. As duas se dão muito bem.
–
Há tempos não vejo a Jéssica. Quando a vi, era muito pequena.
–
E como está o seminário? – questiona Isabel de forma efusiva.
–
Tudo caminhando bem. Estou evoluindo bastante. Cada vez mais fico convicto da
minha vocação.
–
Fico feliz, Lucas! Você será um ótimo padre.
–
Deus te ouça! Só quero cumprir a missão aqui na Terra que o Pai destinou para
mim.
–
Amém!
–
Amém!
Noite
fria. O sereno umidifica as brácteas da Primavera.
Lucas tece a leitura da obra Confissões de
Santo Agostinho. Tinha o hábito de dormir cedo, fez a oração e deitou. Ao
acordar, foi para o quintal contemplar os pássaros na Amoreira. Enquanto toma café:
–
Irmão! Irmão! Jéssica chegou.
–
Seja bem-vinda, Prima.
–
Obrigada, Lucas!
–
Irmão, à tarde, faça companhia a Jéssica, pois estarei na escola – admoesta
Amanda.
–
Tudo bem – responde Lucas.
–
Jéssica, vamos tomar café. Fique à vontade.
–
Vamos.
Tarde
invernal. As gotas de chuva resvalam no telhado. Cheiro de terra molhada. As
andorinhas se abrigam nas cumeeiras. Lucas dialoga com Jéssica:
–
Há tempos não te vejo.
–
Eu era bem pequeninha. Agora sou mulher! – Jéssica dispara um riso discreto e
icônico.
–
Você tem quantos anos?
–
16. E você?
–
21.
–
Estamos na flor da idade – Jéssica levanta, senta ao lado do primo e cruza as
pernas.
Visivelmente,
Lucas ficou numa situação desconfortável. Jéssica trajava um vestido curto bem colado ao corpo, e o seu agradável perfume exalava pela sala. Após um
“silêncio ensurdecedor”:
–
Fale, Primo. E como está tua vida no seminário?
–
Tudo em paz.
–
Graças a Deus! – Jéssica coloca a mão na perna do agora nervoso Lucas.
–
Vou. Vou aqui na cozinha.
–
Vá. Não demore!
–
Fique à vontade para mudar de canal.
Ao
invés da cozinha, Lucas correu para o quarto e trancou a porta. Deitou e pensou:
“Não sei o porquê de tanto nervosismo.
Nunca aconteceu isso comigo. Será que foi a presença de Jéssica? Creio que não,
afinal sou um servo de Deus. Preciso investigar a causa de tal sensação”.
Subsequente
ao primeiro diálogo a sós, Jéssica não perdia a oportunidade de olhar para
Lucas. No jantar, o jovem seminarista demonstrava pejo perante os olhares
diretos e lascivos da prima. As conversas vespertinas não continuaram. Jéssica
não desgrudava do celular. Quando os dois se “batiam” nos corredores, ela não
titubeava em aproximar-se ao máximo de Lucas, até que num determinado dia,
ocorreu um abraço. Lucas ficou estático com o gesto intempestivo da prima.
Subitamente, uma energia diferente atingiu o âmago do seminarista. Jéssica
encerrou o abraço e Lucas evadiu: “Deus,
tenha piedade deste teu filho. O semblante sádico do pecado sorriu para mim. O
meu corpo foi tomado pela concupiscência. Não posso negar que Jéssica despertou-me
atração física. Senhor, conceda-me Luz e Sabedoria para enfrentar a tentação da
carne. O pecado não pode derrotar o espírito”.
Certa
tarde, Isabel saiu para fazer compras no supermercado. Pela primeira vez, Lucas
e Jéssica sozinhos sob o mesmo teto:
–
Primo, venha aqui no quarto. Estou me sentindo tão carente.
Ausência
de resposta:
–
Venha, Priminho!
Persistência
do silêncio:
–
É melhor você vir – bradou Jéssica em tom ameaçador.
Lucas
estava na sala tentando concentrar-se na leitura das Sagradas Escrituras. Enfim, a surpresa:
–
Posso sentar ao teu lado?
–
O que é isso? – questiona o estupefato Lucas.
–
Você gostou?
–
Vá se vestir – Jéssica exibia uma provocante lingerie lilás de renda.
A
atrevida ninfeta não atendeu a reivindicação do seminarista. Ela se aproxima
sorrateiramente e coloca as mãos nos braços da poltrona. Lucas parecia uma
presa encurralada, e esquivava-se das tentativas de beijo da prima. Num momento
pontual, ficou sem forças e recebeu vários beijos. Talvez, para o alívio de
Lucas, a campainha tocou e Jéssica saiu.
A
Lua Cheia emergia imponente no horizonte. A brisa caia do dossel. Constrangido,
Lucas nem acompanhou a família na janta. Enclausurado no quarto, incidiu em
reflexões: “Deus de Israel, interceda por
mim. Estou sendo tentado pelo diabo. Eu não posso deixar a treva vencer a luz.
Jéssica é insana e petulante. Tão nova, em contrapartida, lasciva e devassa. É
inegável que ela é bonita: cabelos longos e lisos, curvas corporais milimetricamente
perfeitas e rosto fotogênico. Senhor, perdoe-me por tal pensamento.
Infelizmente, na tarde de hoje, senti uma atração física avassaladora. Fiquei
com vontade de beijá-la. Porém, não me é permitido consumar este desejo,
afinal, sou um cordeiro de Deus. Se bem que, sou um mero mortal predisposto ao
pecado. Estou acorrentado pela dúvida. Eis a questão: pecar ou não pecar?”.
Os
uivos da ventania “imitam” os assobios das almas. A chuva fina confunde-se à
neblina. O frio arrepia as entranhas. O relógio de parede indica meia-noite. Sono
rebuscado de inquietações. O corpo vira para os lados a procurar a melhor
posição. Neurônios a mil. A chama da vela de Santa Mônica é desestabilizada pelo
fluxo de ar gerado pelo movimento de abertura da porta. Passos calculados
contrastam com as batidas aceleradas do coração. Lucas vislumbra um vulto. A
lâmpada é acesa. Em postura altaneira, Jéssica esbanja um curtíssimo vestido
lilás. A leve vestimenta “desaparece”. Corpo nu e esbelto é revelado na mais
intensa sensualidade. Lucas efetua dois passos até a prima. O beijo é
concretizado. Línguas quentes e molhadas entrecruzadas. Elevação dos batimentos
cardíacos A lúbrica Jéssica emite sussurros provocantes. O corpo de Lucas
alcança um nível de tremor jamais sentido. Alternância entre movimentos lentos
e rápidos. Gotas de suor surgem nos rostos. Olhos entreabertos. Gemidos agudos
de prazer. Êxtase! Suor frio! Sensação de relaxamento! Entrementes à
recuperação do fôlego, Lucas regressa à bendita reflexão: “Eis a questão: pecar ou não pecar? Resposta: valeu a pena PECAR”.
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