Nos
últimos tempos, a democracia jamais
fora tão exaltada; virou “modinha” nas redes sociais ser um defensor da
democracia. Este regime político surgira no século V a.C., em Atenas, no
reverenciado período clássico da história grega. Clístenes, considerado o “pai
da democracia”, empreendera uma grande reforma política, incluindo no corpo de
cidadãos alguns estrangeiros e ex-escravos, dividindo-o em agrupamentos administrativos,
os chamados demos, termo que adquiriu
o significado de “povo” ou “maioria”. Cracia
vem de Cratos, que quer dizer
“poder”. Teoricamente, eis o governo do
povo, o poder da maioria. A
reforma de Clístenes aumentara a representação social na Assembleia Ateniense.
No mundo grego, os políticos deveriam zelar pela democracia, além da primazia do bem comum, por conseguinte, o político é aquele que encara a coisa
pública como algo sagrado. O bem comum é a bússola dos verdadeiros políticos
(autênticos democratas).
Recentemente,
os meios de comunicação noticiaram várias matérias sobre movimentos favoráveis
à democracia. Os entusiastas do fascismo imaginário se colocaram como baluartes
na luta pelo movimento democrático. Não nego que foi comovente testemunhar o
empenho de algumas torcidas organizadas na defesa da democracia. Desejaria
presenciar, em dia de clássico, um torcedor com a camisa do time do coração no
meio de uma torcida rival. Eis a questão: será que o espírito fraternal e
democrático afetaria esses torcedores? Ademais, assistimos o recrudescimento
dos ANTIFA, estes também se autodenominaram os paladinos da democracia.
Curiosamente, em Londres, asseclas do movimento supracitado picharam a estátua
de Winston Churchill. Quem conhece minimamente a história do século XX, sabe o
quão Churchill fora um ferrenho opositor do nazifascismo e um bastião contumaz
da democracia.
Doravante,
centralizaremos a nossa singela reflexão na conjuntura política do Brasil. Há
tempos, no nosso país, o termo político
angariara uma série de adjetivos negativos no léxico do imaginário popular:
corrupto, ladrão, incompetente, oportunista, etc. Ser político é o símbolo
daquilo que há de mais sórdido na sociedade. As adjetivações elencadas foram
guarnecidas pelos incontáveis casos de corrupção, haja vista o Mensalão e o Petrolão. Certos militantes esbravejam por aí que estes últimos não
existiram: “é tudo invenção da mídia golpista”. É válido enfatizar que o
alcance das redes sociais potencializou a identificação e a notoriedade de políticos
corruptos. Recordemos que a Operação
Lava-Jato devassou e expurgou a classe política corrupta, abrindo fraturas
descomunais que enfraqueceram os partidos.
Insofismavelmente,
o povo não se sente mais amparado pelos partidos, porquanto os mesmos privilegiaram
os anseios de filiados e sectários. Os partidos perderam de vez a mínima
representação popular que ostentavam num pretérito recente. A conjuntura de
descrença partidária engendrou um vácuo de poder, espaço que está sendo ocupado
pelo personalismo. Recorramos ao dicionário Caldas
Aulete: “personalismo (per.so.na.lis.mo) sm. – 1 Qualidade do que é
pessoal. 2 Tendência a impor os
critérios ou as vontades pessoais”. O sistema partidário do Brasil é caro e
ineficiente, uma miscelânea caótica superior a 30 partidos que apresentam poucas
diferenças entre si e consumem bilhões de reais oriundos do fundo partidário. Se
não bastasse a elevadíssima, abusiva e sufocante carga tributária, o povo ainda
fica com o ônus de sustentar essa horda de partidos abjetos.
O
vazio deixado pelos partidos foi preenchido pelos políticos. Eu poderia listar
várias raposas políticas, não obstante, limitar-me-ei a citar os nomes mais
expressivos. Comecemos, obviamente, com o Presidente Jair Bolsonaro (sem
partido), candidato pelo desconhecido PSL, que atingira uma projeção tão
somente pela onda bolsonarista na derradeira eleição (2018). O PT, não tem mais
a força de outrora, pois transformou-se num títere dos caprichos e embustes de
Lula. O histórico PDT de Leonel Brizola, ofuscado pela figura dúbia do eterno
candidato a presidente Ciro Gomes. O DEM, antigo PFL, é apenas a sigla
partidária de ACM Neto, Maia e Alcolumbre. Hodiernamente, a democracia
solapou-se ainda mais pelo tóxico personalismo, cuja parte expressiva do
eleitorado tem como parâmetro a falácia do líder político.
O
eleitor não prioriza o projeto propositivo da candidatura, outrossim, suscita a
identificação pessoal com o candidato. O presente estágio da nossa democracia
abre uma brecha ao nocivo populismo, fenômeno político tão recorrente na
América Latina, vide o peronismo na
Argentina e o getulismo no Brasil. É
oportuno relembrar que o descrédito dos partidos deve-se também aos sucessivos
escândalos de corrupção. Nem a maldita pandemia do Coronavírus conseguiu
defenestrar, pelo menos temporariamente, a praga da corrupção, por sinal, já
assistimos o advento de mais um escândalo de desvio e ingerência de recursos
públicos: o Covidão. É nítida e grave
a doença que acomete a democracia brasileira, cujo personalismo está entre os
seus sintomas mais icônicos e deletérios.
(Tosta Neto, 12/07/2020)
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