
O dramaturgo alemão Bertold Brecht
ficaria entusiasmado com a descoberta arqueológica de uma estatueta do deus
fenício-cananeu Baal. Isto porque, em 1918, Brecht estreou sua primeira peça
intitulada “Baal”, que tratava da vida mundana na Alemanha e se inspirava no
deus da carne, conforme a sua interpretação.
O artefato data, provavelmente,
entre o século XII e X a.C. e foi encontrado por estudantes numa colaboração,
desde 2018, entre a Universidade de Macquarie (Austrália), da Universidade
Hebraica de Jerusalém e da Autoridade de Antiguidades de Israel, na cidade de
Khirbet el-Rai (Israel). Também foram encontrados dois selos, uma estatueta de
bronze de um bezerro e cerâmicas cananeia filisteia. Em contraste ao deus Baal
cultuado durante o período politeísta, a descoberta encerra a polêmica sobre a
existência do rei Davi (1040 a.C. e 970 a.C.), importante personagem bíblico
que matou Golias em umas das passagens mais heroicas das escrituras religiosas.
Todas as evidências apontam para a tese de que a cidade seja Ziclague, que teve
seu paradeiro desconhecido por séculos.
A descoberta só foi possível porque
uma equipe de 32 estudantes escavou 1,7 hectares (17.000 m2), entre os dias 26
de janeiro e 13 de fevereiro. O trabalho braçal, e ao mesmo tempo especializado
e minucioso, foi decisivo para o encontro das preciosidades históricas. Sob sol
quente foi preciso escavar, peneirar e descartar inúmeros baldes de terra para
chegar aos objetos. O dr. Gil Davis, diretor do Programa de Israel Antigo da
Universidade Macquarie, declarou que é natural ter “grandes esperanças e baixas
expectativas, mas é claro que é maravilhoso quando fazemos descobertas
emocionantes. Sonhamos em descobrir coisas que mudarão nossa compreensão de uma
parte significativa do passado antigo”.
Em outras ocasiões se acreditou que
a cidade de Ziclague realmente havia sido encontrada, mas as evidências desta
vez são muito mais claras. O sítio arqueológico apresenta significativos
indícios como: construções filistinas, um incêndio que coincide com escritos
bíblicos (a cidade fora atacada pelos amaquelitas), cerâmicas enterradas como
oferendas, embarcações usadas, armazenamento de vinho e óleo, lâmpadas a óleo,
santuário portátil, ponta de lança de bronze. Os pesquisadores descobriram que
havia uma arquitetura sofisticada com edifícios domésticos e com possíveis
conexões internacionais, contrariando a ideia de dispersos assentamentos da
época. No próprio assentamento os pesquisadores montaram um laboratório químico
para testes preliminares de como identificar, nos resíduos do solo, restos de
vinho e óleo, sinais claros de uma civilização.
Ziclague, conforme dados do antigo
testamento nos livros de Samuel, abrigou o rei Davi por 14 meses. Sob a
proteção do rei filisteu Aquis, Davi se refugiou ao fugir do confronto com o
rei Saul. Foi nessa fuga que o jovem Davi matou o gigante Golias. Com a morte
do rei Saul, Davi voltou a Hebron, onde se tornou rei e manteve Ziclague sob
seus domínios no reino de Judá. Historiadores acreditam que Davi tenha
governado uma região com cultura sofisticada e arquitetura elaborada, além da
adoração monoteísta do deus Javé. A tradição religiosa diz que Davi foi
impedido — por Deus — de construir um local para adoração da tábua dos 10
mandamentos de Moisés: o motivo seria o seu envolvimento constante em guerras.
Esse desejo de Davi foi realizado mais tarde pelo seu filho, o rei Salomão.
Deus das orgias
A existência do culto a deuses
politicamente incorretos era comum no mundo politeísta. Historicamente encontram-se
registros do deus Baal em fontes fenícias, cananéias, babilônicas, aramaicas e
egípcias. Cada deus atendia a características específicas e eram conclamados
conforme a ocasião. Ainda assim houve perseguição em Israel aos seus
adoradores. Há relatos de que os cultos ao deus Baal eram promovidos com festas
orientadas com bebedeira e orgias. O transe e histeria davam o tom. Era comum
durante os cultos se promoverem rituais de sacrifício. O deus pagão atendia por
várias características em localidades diversas. Ele podia ser a tempestade ou
dominador das águas primitivas e, portanto, referência de um deus da natureza.
Podia ser a fertilidade e fecundidade, assumindo tanto o poder para a colheita,
quanto para a lascividade, exatamente o lado mais explorado e apreciado pelo
poeta alemão Bertold Brecht.
(Fonte: IstoÉ / Edição OutroOlharInfo)
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