O Coronavírus literalmente parou o
mundo. Precisaremos dum distanciamento temporal expressivo para mensurar o real
estrago provocado pela pandemia supracitada. O fato é que o mundo não será mais
o mesmo, cujos alguns valores e paradigmas serão repensados. Não percamos tempo
em hipóteses no tocante à indefinição que incide no porvir e analisemos a
temática em questão. Desde a Segunda Guerra Mundial até os tempos hodiernos, a humanidade
passa por seu período mais difícil, tão difícil que algumas pessoas já
especulam sobre o advento do fim dos tempos ou o retorno do Messias.
Epidemias não são raras. A história
está repleta de exemplos, apontando que a proliferação de doenças é algo
corriqueiro. Na Idade Média, precisamente no século XIV, a Peste
Negra (tipo de peste bubônica
transmitida por pulgas) dizimou um terço da população europeia. Os conhecimentos
médicos da época eram ineficazes para combater a epidemia; a ira de Deus diante
do pecado humano fora a explicação mais difundida para justificar tal doença.
Em Mucugê (Chapada Diamantina), por volta de 1855, principiara a construção do
Cemitério Santa Izabel, mais conhecido como Cemitério Bizantino, após um surto
de cólera atingir a região. Com o decreto imperial que proibia o enterro dos
mortos nas igrejas, o icônico cemitério foi erguido no sopé da montanha, num
local bem afastado da zona urbana. No Rio de Janeiro, no início do século XX,
houve um surto de varíola, logo, o presidente Rodrigues Alves enviou um projeto
de lei ao Congresso Nacional propondo a obrigatoriedade da vacinação contra a
varíola, o que viera a ser uma das causas da Revolta da Vacina (1904). No século XXI, houve o registro de outras
epidemias: Gripe Aviária, SARS e H1N1.
É notório que muitas pessoas estão
apavoradas com o Coronavírus. Este temor é compreensível, pois o vírus tem um alto
poder de contágio, além de ser obviamente um inimigo invisível, por conseguinte
suscita uma guerra árdua para combatê-lo. No campo de batalha é terrível
enfrentar um oponente oculto, porquanto não se sabe de onde virá o ataque,
gerando uma certa histeria nos combatentes. No front, quando o inimigo é facilmente identificável, o general terá
mais informações para um planejamento eficiente da “arte da guerra”. O Covid-19,
como qualquer outro vírus epidêmico, transmuta-se na personificação do diabo.
Como ocorrera na Idade Média, há interpretações que conjecturam que o Coronavírus é uma
consequência da ira divina. Eis a questão: o homem contemporâneo não é tão
diferente do homem medieval.
As epidemias atingem o inconsciente
coletivo, este último, permeado por imagens apocalípticas. A pandemia do
Covid-19 aflorou ainda mais no imaginário popular a iminência do fim dos
tempos. O Coronavírus é visto como um presságio que sinaliza que a aniquilação
do mundo se aproxima. Na luta contra um “demônio” invisível, a fé é guarnecida,
portanto, apenas a Providência Divina tem o poder para livrar o mundo desta
peste. O Apocalipse está em voga. Quiçá o Coronavírus seja uma das pragas dos
sete anjos apocalípticos. Ouçamos a Palavra: “E vi outro grande e admirável
sinal no céu: sete anjos, que tinham as sete últimas pragas; porque nelas é
consumada a ira de Deus” (Ap 5:1).
Incontestavelmente, a tragicidade
do Coronavírus provocou um tsunami no inconsciente coletivo, desde o temor
desenfreado perante um carrasco invisível até reflexões sobre a fragilidade da
vida. A pandemia mostrou também, em detrimento do avanço exacerbado da medicina
nos derradeiros anos, o quão a humanidade ainda está desamparada. Apesar do dom
da racionalidade e de toda capacidade de produção de riquezas materiais, os
seres humanos ficaram de joelhos defronte a um ser biológico muito inferior. A
humanidade, pelo menos presentemente, percebe que não tem a força para controlar
tudo. O antropocentrismo está tonto e navegando de forma desnorteada. O
Coronavírus só reforça a tese o quanto a vida é tênue. Oxalá que o mundo saia
mais forte desta pandemia, haja vista o poder de catarse que a tragédia traz
consigo. Enfim, que saiamos fortalecidos e purificados desta pandemia que
assola a humanidade.
(Tosta Neto, 06/04/2020)
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