Ex-governador
afirma que comprou por R$ 80 milhões a boa vontade da Fundação Roberto Marinho
Condenado — por enquanto — a quase
100 anos de prisão, Sérgio Cabral aparece abaixo apenas de Marcola (340 anos)
no ranking dos bandidos que têm de calcular em séculos o tempo de permanência
na cadeia. Para alcançar tal proeza, o ex-governador do Rio montou a quadrilha
mais gananciosa e abrangente da história. Durante oito anos, roubou em parceria
com secretários de Estado, deputados federais e estaduais, senadores,
empresários nacionais e estrangeiros, prefeitos, desembargadores, conselheiros
do Tribunal de Contas, desembargadores e ministros de tribunais superiores,
fora o resto.
Alianças com figurões federais
completaram a blindagem que fez de Cabral uma das mais abarrotadas caixas
pretas da criminalidade VIP. Ele arrombou todos os cofres ao alcance da máquina
administrativa fluminense. E extraiu propinas negociando extrair merenda
escolar, refinarias, quentinhas dos presídios, obras viárias, bondes de Santa
Tereza, plataformas da Petrobras — nada, rigorosamente nada escapou à gula do
delinquente que, durante um interrogatório, confessou que tinha o vício da
ladroagem.
Quem faz o que fez Cabral tem muita
história para contar — e muitos comparsas a revelar. Por isso, muita gente
estranhou as sucessivas dificuldades que retardaram o fechamento de um acordo
de delação premiada com a Lava Jato. Até que veio, recentemente, o acerto com a
Polícia Federal já homologado pelo ministro do STF Edson Fachin. As primeiras
revelações confirmaram que foi enfim aberto um baú de safadezas que deverão
iluminar catacumbas ainda indevassadas.
Ainda em seu início, o cortejo de
bandalheiras revelou de onde veio o dinheiro para a compra do sítio em Atibaia.
Nesta sexta-feira (03), começou a sair da caixa preta um capítulo inteiro
dedicado à rede Globo. As primeiras revelações explicam a irrelevância
atribuída pelos telejornais da empresa ao que Cabral já contara ou tem a
contar. Essa boa vontade teve um preço.
Segundo o ex-governador, o silêncio
da rede Globo custou pelo menos R$ 80 milhões, valor do acerto sem licitação
que contemplou a Fundação Roberto Marinho com a gerência de estudos, projetos e
desenvolvimento de conteúdo para a implantação de um vistoso equipamento
cultural na cidade do Rio. Ainda de acordo com Cabral, uma licitação
fraudulenta permitiu à fundação indicar a construtora responsável pela obra.
Isso garantiu a proximidade do governante delinquente com a família Marinho,
informam os depoimentos à Polícia Federal.
É improvável que a revelação
consiga espaço nos telejornais da Globo. Todos estão concentrados na coleta de
números e declarações que transformam a pandemia de coronavírus na anunciação
do fim do mundo. Versões que expliquem a história dos R$ 80 milhões podem
esperar.
(Fonte: R7 / Texto: Augusto Nunes)
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