A
Copa do Nordeste já há alguns anos se tornou, para muitos, o torneio mais
interessante do primeiro semestre no país. As grandes equipes da região se
enfrentam em busca de um título fora dos seus estados e protagonizam clássicos interestaduais
cheios de rivalidade como Bahia x Sport, Ceará x Vitória ou Fortaleza x Santa
Cruz. Finais memoráveis como Bahia 3 x 1 Sport (2001), Ceará 1 x 1 Sport (2014),
Campinense 2 x 0 Asa (2013) e América-RN 3 x 1 Vitória (1998) ainda estão muito
bem guardadas na memória afetiva de muitos torcedores. A Copa do Nordeste foi o
único regional que realmente caiu nas graças do público.
Com
cotas em torno de R$ 34,3 milhões a serem divididas entre os seus participantes,
a Copa do Nordeste substituiu os falidos estaduais como alternativa
orçamentária mais interessante, um avanço do nível de competividade dos clubes
da região e um estágio de preparação mais avançada para as competições
vindouras como o Campeonato Brasileiro. Ao invés de enfrentar muitos times
semiamadores do interior dos seus respectivos estados, quando eram enganados esportivamente
com vitórias acachapantes contra equipes medíocres, as maiores agremiações desta
parte do país duelam entre si aproximando-se do nível de competividade que
terão em disputas mais acirradas. O fortalecimento do regional representa uma
tendência de se enxergar os estaduais como torneios de pré-temporada, onde
serão utilizadas equipes de aspirantes, times alternativos ou os titulares apenas
pontualmente. O Athletico-PR é a equipe pioneira nessa metodologia, seguida
também por Bahia e Vitória, além do poderoso Flamengo.
Volta
e meia pipocam mundo afora, principalmente na Europa, propostas de criação de
superligas, ou seja, de campeonatos em que apenas os gigantes dos diversos
países do continente se fariam presentes e em que os certames nacionais
funcionariam como uma espécie de torneio de acesso a essas competições. Não
seria uma copa europeia nos moldes da atual Liga dos Campeões, mas uma disputa
de pontos corridos. Nos Países Baixos especulam a formação de uma liga que
uniria as principais equipes da Holanda e da Bélgica. Ideias como essas já
foram pensadas no Reino Unido. Tais propostas poderiam servir como influência
para a consolidação da Copa do Nordeste como uma liga de verdade, mais forte,
merecedora de mais datas de jogos, dinheiro e prioridade dos clubes locais. Evidentemente
não seria possível uma competição de pontos corridos por falta de espaço no
calendário e que também invadiria o Campeonato Brasileiro, como já faz hoje,
diminuindo assim o seu interesse, todavia, o número de jogos dos estaduais poderia
ser ainda mais diminuído.
É
inegável que várias equipes da região vêm passando por um processo de
reestruturação com investimentos em estrutura, profissionalismo e trabalhos de
longo prazo. Em que pese às dificuldades financeiras de equipes tradicionais
como Sport Recife e Vitória, clubes como o Bahia, Fortaleza, Ceará, CSA e
Confiança estão mudando aos poucos de patamar no cenário nacional, embora ainda
longe da atenção da grande mídia. A construção da Copa do Nordeste em um
torneio realmente forte serviria para que, além de fortalecer os clubes locais,
fomentassem o combate por reservas de mercado, tendo em vista que o Nordeste
ainda sofre forte influência de equipes do eixo Rio-São Paulo, que se reflete
pela torcida dos nordestinos por instituições esportivas dessas regiões ou
mesmo de aficionados “anfíbios”, ou seja, que torcem para dois ou mais clubes,
normalmente um do estado em que residem e outro(s) do sudeste.
É
preciso se fazer justiça de que essa percepção de que o “Nordestão” poderia ser
a válvula de escape para a construção de um futebol local mais poderoso foi
idealizada por Paulo Carneiro, antigo e atual presidente do Esporte Clube
Vitória, ainda nos anos 90. Levantando essa bandeira quase que isoladamente, o
dirigente do maior campeão do torneio (quatro títulos) nada pôde fazer ao ver
as suas ideias sucumbirem diante da covardia dos demais dirigentes de clubes,
que preferiram se render à época à força das federações de futebol dos estados.
A disputa ao longo dos anos foi sofrendo ataques por meio da falta de interesse
das emissoras de televisão em realizarem suas transmissões, baixas cotas
financeiras, descaso dos clubes e boicotes, como ocorreu com o Sport Recife,
que se negou a participar do torneio por dois anos. Ainda assim, a competição
sobreviveu e continua firme e forte. Hoje conta com quatro clubes da série A
(Bahia, Ceará, Fortaleza e Sport), cinco da série B (CSA, Confiança, CRB,
Náutico e Vitória) e outras agremiações tradicionais como o Santa Cruz, América
de Natal e o ABC. A evolução dessa copa é visível e ainda poderá ser mais
acentuada conforme o nível de prioridade que receba por parte dos clubes e
organizadores.
Torna-se
essencial que o futebol do Nordeste possa cada dia mais se organizar visando
estar minimamente competitivo em cenário nacional, principalmente nestes tempos
em que algumas equipes como Flamengo e Palmeiras ensaiam uma hegemonia do
futebol brasileiro irrigadas com muito dinheiro, estrutura e mídia. Período em
que se consolidou a implosão do chamado “Clube dos 13”, quando as negociações
por cotas de televisão eram realizadas em grupos, mas que hoje, com o fim da
entidade, favoreceram equipes do sudeste como, além das citadas, também a
Corinthians e São Paulo, detentoras de torcidas nacionais e que recebem grande
acompanhamento da imprensa do país, que agora negociam bilateralmente com as
empresas de mídia, recebendo muito mais dinheiro que a maioria dos outros
clubes do país. Uma Copa do Nordeste
forte pode servir como um bastião que venha a contribuir para o fortalecimento
do futebol local, combatendo essa tendência de forte monopólio financeiro de um
restrito grupo de equipes.
(Geisson
Peixoto, 28/02/2020)
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