O
pleito eleitoral de 2018 encontra-se marcado por muitas tensões. Há quatro
anos, testemunhou-se a eleição mais suja da história republicana do Brasil. Os
arautos do otimismo anunciaram que as turbulências passariam, mas as tensões
políticas permaneceram e foram amplificadas de forma incomensurável. Em meio ao
caos político que o Brasil está chafurdado, o voto poderia ser um meio para
amainar a mixórdia que paira no ar. O voto é um dos ícones da democracia,
elevado ao status de transmutação sociopolítica, contudo, as mazelas imersas no
sistema eleitoral brasileiro diluem o poder do voto. Não é tão simples a
análise deste fenômeno, pois o voto em si traz um fardo de complexidade.
No
Estado Democrático de Direito, por intermédio do voto, o povo escolhe seus
representantes. O ato de votar não é apenas um ato político, por conseguinte,
há uma intencionalidade que foge do escopo estritamente eleitoral. No plano
ideal, o voto é uma atitude alicerçada na racionalidade, cujo eleitor escolhe
os representantes mais preparados. Todavia não estamos na República de Platão.
O eleitor é movido por um turbilhão de emoções que destroça a suposta
racionalidade do voto. Raramente, o eleitor se debruça na análise meticulosa
dos planos de governo de cada candidato e, no final, escolhe aquele que tem
segundo o seu crivo o melhor projeto. Por mais que Apolo tenha vencido Dionísio
na batalha de formação do Ocidente, o ser humano constantemente flerta com o
deus da embriaguez.
Numa
eleição, as pessoas ficam à flor da pele. A temática política fica em evidência nos bate-papos presenciais e virtuais. Comumente,
os candidatos são posicionados à categoria de semideuses, ocorrendo um “esquecimento”
de partes negativas das trajetórias políticas em questão. Olvida-se:
inexperiência em gestão, improbidade administrativa, apadrinhamento político,
declarações polêmicas, etc. Diante do quadro descrito acima, conclui-se que o
voto também é um ato carregado de subjetividade, logo, critérios como simpatia
por um partido ou ideologia e identificação pessoal, acabam por influenciar no
ato de votar. Traçando uma analogia com a fenomenologia de Husserl, suscita-se
uma intencionalidade entre a consciência do indivíduo (eleitor) e o fenômeno
(voto). A intencionalidade do voto evade do script
da razão.
O
voto é uma miríade de sensações que resiste à qualquer análise simplória e
reducionista. O maior símbolo da democracia precisa passar por uma reflexão que
abarque uma série de fatores. O voto personifica a vontade individual; não
necessariamente essa vontade perpassa pelos anseios da nação. Os candidatos
eleitos simbolizam a soma de vontades individuais. Ademais, as vontades dos
eleitos também não coadunam aos interesses do país. Numa “república bananeira”
como a nossa, o político não faz jus à noção grega de política (bem comum). A vontade individual suplanta a vontade
geral. Categoricamente, a relação entre o eleitor e o voto alinha-se à
complexidade fenomenológica, logo, o analista de conjuntura política necessita
elencar circunstâncias subjetivas que favoreçam a compreensão do fenômeno do
voto. Todo ato humano traz consigo uma
intencionalidade; é obvio que o ato de votar não fugiria desta máxima.
Aguardemos
a consumação do pleito eleitoral de 2018. Independentemente do resultado, a priori, teremos um farto repertório a
ser analisado. Apesar do avanço oriundo com a aplicação da Lei da Ficha Limpa e dos escândalos de corrupção revelados pela Operação Lava Jato, as velhas raposas
políticas continuam distribuindo as cartas no tabuleiro eleitoral. A República
do Brasil está com a estrutura carcomida, cujo sistema dificulta a renovação
dos quadros políticos. O “velho” insiste em permanecer na conjuntura eleitoral.
Subsequente ao resultado das eleições e à tímida renovação dos nossos
representantes, uma vez mais, será mister considerarmos a complexidade
fenomenológica entre o eleitor e o voto.
Tosta Neto, 26/09/2018
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