As
duas nuvens de Magalhães, pequenas galáxias que estão na órbita da Via Láctea,
se chocaram há 200 milhões de anos – e estão de mãos dadas desde então
Se você acha os censos
demográficos da Terra meio tediosos – desculpa, IBGE –, você talvez goste mais
dos que são feitos no céu. Um observatório espacial europeu chamado Gaia está
desde 2013 no vácuo fazendo um catálogo com a posição e o brilho de mais de um
bilhão de estrelas da Via Láctea e de suas redondezas – um Google Maps
tridimensional da nossa vizinhança cósmica.
A resolução do
telescópio, projetado pela Agência Espacial Europeia (ESA) e lançado em 2013, é
semelhante à do Hubble, seu irmão mais velho. Mas sua abrangência é muito
maior: ele é capaz de varrer todo o céu em só um mês, e ao final do ciclo
voltar do início. O resultado é um registro preciso de como cada estrela
evoluiu no céu ao longo do tempo – dá para saber quais astros estão pulsando e
até quais explodiram. Um verdadeiro paraíso da informação para os astrônomos:
mais ou menos como a sensação de dirigir com o aplicativo Waze depois de alguns
meses usando um mapa de lista telefônica.
Com esses dados em
mãos, um grupo de pesquisadores da Universidade de Cambridge, na Inglaterra,
decidiu entender melhor a história das galáxias anãs que estão na órbita da Via
Láctea usando estrelas chamadas RR Lyrae. Elas são antigas e brilham pouco, e
por causa disso são muito estáveis: pulsam a taxas conhecidas e previsíveis.
Assim, servem de ponto de referência para entender o que mudou ao redor delas.
A descoberta mais
notável do grupo, até agora, é uma ponte de estrelas de 43 mil anos-luz ligando
as duas acompanhantes mais famosas da Via Láctea: a Grande Nuvem de Magalhães
(LMC), de 14 mil anos-luz de diâmetro, e sua irmã menor, a Pequena Nuvem de
Magalhães (SMC), com exatamente metade do tamanho. Apesar da aparência idílica,
ela é o resultado de uma colisão muito, muito grande. “Nós comparamos o formato
e a posição da ponte a simulações das duas nuvens de Magalhães conforme elas se
aproximam da nossa galáxia”, explicaram os pesquisadores. “Muitas estrelas da
ponte parecem ter sido arrancadas da SMC há 200 milhões de anos, quando as duas
galáxias-anãs passaram muito perto uma da outra.”
Outras podem ter sido
arrancadas da LMC pela própria interação gravitacional com a Via Láctea, que é
muito maior. A ponte, no fim, acaba servindo como uma espécie de rastro, uma
trilha de pedrinhas deixada pelas galáxias-satélite conforme elas cortam o céu.
Um registro muito útil considerando que elas se movem devagar demais para a
percepção humana, e que pode ajudar os astrônomos a entender como funciona o
jogo de forças entre objetos tão grandes quanto aglomerados de bilhões de
estrelas – a Pequena Nuvem de Magalhães, sozinha, tem massa equivalente a 7
bilhões de sóis.
(Fonte: Superinteressante)
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