O retrato do capitalismo petista
03/01/2016 - Elio Gaspari - Colunista - Folha de S.Paulo
O ano que passou e este que está começando entrarão para a história do
capitalismo petista. A repórter Natália Cacioli revelou que pela primeira vez
desde 2002, quando foi criado o Tesouro Direto, um supermercado de papéis do
governo, o número de pessoas que protegeu seu dinheiro com pouca intermediação
financeira superou o de investidores na Bolsa de Valores. Em apenas um ano o
número de clientes do Tesouro Direto cresceu 72%, chegando a 587 mil.
Em
tese, quem aplica na bolsa brasileira investe na produção. Quem vai para o
papelório do Banco Central remunera-se à custa do endividamento do governo.
Com a taxa de juros a 14% (e vem mais por aí), quem foi para o Tesouro Direto
deu-se melhor do que a clientela da caderneta de poupança (137 milhões de
contas). A aplicação preferida do andar de baixo, onde está o dinheiro de
quem se previne contra o desemprego, teve rentabilidade negativa, pois pagará
7,95% contra uma inflação de 10,48%.
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A Bolsa
foi pior, voltou ao nível 2008, acumulando uma queda de 29% no ano. Isso se
deveu em parte à gestão dos comissários na Petrobras e à queda das ações da
Vale, produto da conjuntura internacional, bem como da irresponsabilidade de
sua sócia Samarco, a mãe do desastre de Mariana.
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O PT
produziu a maior taxa de juros do mundo e o pior desempenho internacional do
mercado de ações. Vive-se melhor emprestando dinheiro ao governo e
aplicando-o diretamente no Tesouro do que investindo na produção de seja lá o
que for. Sempre que isso acontece, a vida dos brasileiros piora.
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A
expansão dos fregueses do Tesouro Direto reflete uma cautela dos
investidores. Além de buscar remuneração nos papéis da Viúva, preferiram
evitar aplicações mais sofisticadas em fundos de instituições financeiras.
Fugiram de todos os riscos, no que fazem muito bem.
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PÉ NO
FREIO
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Em
novembro passado, quando caminhoneiros ameaçavam obstruir estradas em todo o
país, o comissariado do Planalto teve a ideia de chamar a tropa do Exército.
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Ouviram
de volta uma ponderação de um comandante militar:
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Obstruir
estradas é um crime e justifica-se o pedido de tropa para retirar os
caminhões. E quando esse mesmo crime for cometido pelo Movimento dos Sem
Terra, por índios ou organizações sindicais, os senhores vão chamar o
Exército de novo?
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Não se
falou mais no assunto.
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Se e
quando ele reaparecer, haverá outra questão: O ministro pede a tropa ao
general, o general dá a ordem a um coronel e ele desloca os soldados,
comandados por um capitão. Quando surgir um cadáver, quem vai para a Comissão
da Verdade?
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A FORÇA
DA DOUTORA
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De um
sábio:
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“Se o
impeachment de Dilma Rousseff for a votação na Câmara e ela tiver mais de 171
votos a seu favor, a iniciativa morre. O PT acha que essa marca mostrará a
força do governo, mas está enganado. Terá conseguido apenas um terço da
Câmara.
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Com
qualquer resultado abaixo de 257 votos, indicativos da maioria absoluta, o
Planalto poderá dizer que Dilma Rousseff escapou do impeachment, mas não terá
muito a comemorar. Ela se livra do impeachment, mas precisa de 257 votos para
voltar a respirar sem a ajuda de aparelhos.”
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O SOL
DE HOJE
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Algum
dia, as poucas árvores plantadas na esplanada que vai da praça Mauá ao Museu
do Amanhã haverão de crescer.
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Até lá,
criou-se ali a maior churrasqueira dos tempos modernos. Para quem gosta de
maquete, ficou uma beleza; para os bípedes, um suplício.
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O
DIÁRIO DE MÁRCIO
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Desde
2003, quando assumiu o Ministério da Justiça, sabia-se que o advogado Márcio
Thomaz Bastos manteve um diário. Nele estariam contados grandes momentos da
crise do mensalão e da queda do ministro da Fazenda, Antonio Palocci.
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Esses
papéis só poderiam ser lidos muito depois de sua morte. Márcio morreu em
2014, não deixou testamento nem indicação do local onde estaria o diário. Até
hoje a família não o encontrou.
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Pena,
porque nele estariam grandes momentos, como o de um ministro que defendia-se
das acusações que lhe faziam durante uma conversa com Lula no Palácio do
Planalto e Nosso Guia disse-lhe:
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#$#@%!!!
Você não consegue parar de mentir?
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Diários
inexistentes são coisas da vida. Durante muitos anos circulou a informação de
que o deputado Thales Ramalho tinha uma pilha de cadernos com anotações dos
segredos do MDB durante a ditadura. Thales morreu em 2004 e esses cadernos
nunca apareceram.
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Ficam
na fila dos mistérios as gravações nas quais o senador Delcídio do Amaral
teria narrado os primeiros escândalos do governo de Lula.
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REVISÕES
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Duas
previsões para 2016, 2017, 2018, 2019 e 2020:
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Primeiro
a pessimista. A economia patinará até o final de 2018, quando será eleito um
novo presidente. Dependendo do resultado, o novo governo precisará de pelo
menos um ano para arrumar a casa. Assim, só haverá refresco em 2020.
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Agora a
otimista: há tanta liquidez no mundo. E com o dólar a R$ 4, investir no
Brasil ficou tão barato que, ao menor sinal de esperança, a economia pode
começar a melhorar ao longo de 2017.
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Os
governadores tiveram uma boa ideia
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Com os
cofres vazios e os serviços públicos em crise, os governadores do Rio, São
Paulo e Brasília puseram uma ideia na mesa: querem participar da cobrança do
atendimento de clientes dos planos de saúde em hospitais mantidos pelo SUS.
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Nada de
novo, pois a lei manda que essa cobrança seja feita. Como disseram Geraldo
Alckmin e Luiz Fernando Pezão, só a União pode cobrar e ela cobra mal. Desde
o século passado as operadoras driblam esse pagamento, ajudadas pela inépcia
da Agência Nacional de Saude. Só recentemente ela conseguiu elevar para R$
335 milhões os valores cobrados, o que ainda é pouco. Vale lembrar que só 30%
das internações eletivas de clientes dos planos foram cobrados pela ANS.
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Se
houvesse alguma dúvida em relação à boa qualidade da ideia, ela foi eliminada
pela reação das guildas das operadoras. A Associação Brasileira de Medicina
de Grupo disse que a medida poderá gerar custos operacionais, encarecendo os
planos privados. Como eles descobriram isso, não se sabe, pois a proposta
ainda não foi detalhada e o que os governadores querem é participar da
cobrança (e da partilha) de um ressarcimento determinado pela lei.
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Noutra
linha de ataque, veio o argumento de que seria pouco dinheiro. É a velha
síndrome da reivindicação sucessiva: não se pode fazer uma coisa enquanto não
se fizer outra, que por sua vez depende que se faça uma terceira e, com isso,
não se faz nada. Na verdade, faz-se: tenta-se ressuscitar a CPMF cobrando
mais um imposto a quem bate com a cara na porta dos hospitais.
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O
governo e as operadoras de saúde privada sabem que estão sentados em cima de
uma bomba, com um mercado poluído por planos enganosos e custos hospitalares
desonestamente díspares. Isso e mais a migração de clientes desempregados
para o SUS.
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