Registro da criança síria, Aylan Kurdi, morta numa praia turca provocou reações intensas e influenciou o debate político |
Discorramos sobre a temática em questão: a
crise migratória do século XXI, demonstrando o calvário de refugiados do
Oriente Médio e da África, que tentam chegar a Europa através do Mediterrâneo,
na esperança inesgotável por dias melhores. Recentemente, o mundo ficou chocado
com a foto do menino sírio de apenas três anos de idade, Aylan Kurdi, que
morreu afogado, cujo corpo foi encontrado e fotografado em 2 de setembro na
praia de Bodrum (Turquia). Arrisco dizer que esta foto é a imagem mais
impactante do século XXI. Quando a vi, senti uma angústia profunda rasgar
impiedosamente o meu interior. A foto de Aylan Kurdi se tornou um símbolo da
crise migratória, forçando os europeus a refletirem um pouco mais a determinada
questão.
O discurso mundial sobre a imigração ganhou
outra ótica depois da divulgação da foto de Aylan Kurdi. A Alemanha, país mais
rico da Europa, mostrou-se susceptível a debater sobre a possibilidade de
abrigar imigrantes sírios. A Inglaterra ainda se mostra resistente à
flexibilização de sua política migratória. Os países ricos não podem se eximir
desta responsabilidade. Todos nós vivemos em único lugar, o Planeta Terra,
logo, não podemos ficar indiferentes à desgraça dos outros. Vamos inverter
hipoteticamente a situação: se os europeus estivessem na mesma condição dos
refugiados do Oriente Médio e da África? É mister que todas as nações se unam e
busquem soluções que pelo menos amenizem a dor destes miseráveis.
O pequenino e pobre Aylan Kurdi morreu em
um naufrágio no Mediterrâneo. Este fato que provocou consternação no mundo
também revela a ação de traficantes que viabilizam a perigosa travessia em embarcações
precárias e lotadas, prática infame que rende milhões de dólares por ano para
alguns. Recordo-me dos traficantes que tanto lucraram com o comércio negreiro.
Às vezes, tenho a leve sensação que na história o enredo continua, embora
mudam-se os personagens. Diariamente, os telejornais mostram flagrantes de refugiados
nestas embarcações. Por causa da complexidade da conjuntura contemporânea –
avanço do Estado Islâmico no Oriente Médio, sobretudo na Síria, guerras civis e
a proliferação da miséria – estudiosos defendem a tese que esta é a pior crise
migratória desde a Segunda Guerra Mundial.
A morte de Aylan Kurdi personifica a morte
de centenas de imigrantes que perdem suas vidas no Mediterrâneo. Tantos Aylans
Kurdi morrem vitimados por guerras, fome, intolerância religiosa, doenças e
naufrágios. Até quando a humanidade ficará cega e surda perante a morte de
milhares de Aylans Kurdi em todo o mundo? Que a morte de Aylan Kurdi seja um
ícone da luta em prol da causa dos desgraçados imigrantes. Que as autoridades
do mundo escutem o choro dos desgraçados imigrantes. Só para registrar, o
pequenino e pobre Aylan Kurdi foi enterrado no dia 4 de setembro, na sua cidade
natal, Kobane, norte da Síria, cidade sitiada pelo grupo genocida Estado
Islâmico. Encerro o texto com as palavras de Abdullah Kurdi, pai de Aylan, que
também perdeu a esposa e outro filho: “como pai que perdeu os filhos, não tenho
nada o que esperar deste mundo. A única coisa que gostaria é que o drama e os
sofrimentos na Síria acabassem, e que a paz retornasse”.
Tosta Neto, 19/09/2015
Tosta Neto é Escritor e Historiador, Colunista e Colaborador do Outro Olhar. |
Essa imagem, principalmente para mim, que tenho um filho na mesma faixa etária, causa-me verdadeiro terror! O mais desalentador é imaginar quantos mais passarão por situações semelhantes, porém, longe dos holofotes da grande mídia internacional. O autor foi extremamente perspicaz no sentido da necessidade de um movimento global, sobretudo, por parte das nações mais poderosas e ricas do mundo (notadamente as da Europa e os Estados Unidos), visando solucionar os problemas que afligem esses povos jogados à própria sorte. É necessário uma atitude muito mais altruísta por parte dos grandes líderes mundiais, pois, enquanto continuarem existindo tragédias como essas, o mundo continuará sendo um lugar em que o ódio, o radicalismo, a fome e a ignorância, infelizmente, pertencerá a muitos em prol de poucos. Salutar para esse contexto, as palavras do antigo poeta latino Ovídio, citado por Rousseau no seu clássico "A origem da desigualdade entre os homens": "Vamos unir-nos para livrar da opressão os fracos, conter os ambiciosos e assegurar a cada um a posse daquilo que lhe pertence. Vamos instituir regras de justiça e de paz, às quais todos sejam obrigados a se conformar, que não façam acepção de pessoas e que de certo modo reparem os caprichos da fortuna, submetendo igualmente o poderoso e o fraco a deveres mútuos." Essa lição é antiga, mas, nunca, plenamente aprendida pela humanidade...
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