Novas delações premiadas complicarão o cenário. Prováveis acusados buscam mecanismos para garantir o foro privilegiado
O projeto
criminoso de poder está com os dias contados. Deixa como legado escândalos e
mais escândalos de corrupção, uma estrutura de Estado minada pela presença de
milhares de funcionários-militantes, obras super-faturadas (e inacabadas) e um
país paralisado. Sem esquecer que produziram a mais grave crise econômica do
último quarto de século.
Ao longo
de 12 anos, conseguiram organizar um aparato de proteção nunca visto na nossa
história. Quiseram transformar as mais altas Cortes de justiça em braços do partido.
Os meios de comunicação de massa foram sufocados pela propaganda oficial. Os
bancos e as empresas estatais foram convertidos em correias de transmissão dos
marginas do poder, como bem definiu, em um dos votos da Ação Penal 470, o
ministro Celso de Mello. Não houve nenhum setor da sociedade sem que a presença
do projeto criminoso de poder estivesse presente. Pelo medo, poder e omissão de
muitos (empresários, jornalistas, políticos, intelectuais, entre outros),
conseguiram impor a ferro e fogo sua política.
Deve ser recordado que, ao
terminar seu segundo mandato, Lula era avaliado positivamente pela ampla
maioria dos brasileiros. Diziam que seria candidato a secretário-geral da ONU
ou a presidência do Banco Mundial. Tudo graças a sua sensibilidade social, aos
êxitos econômicos e à preocupação com os mais pobres. Hoje, sabemos que no
mesmo período o petrolão alcançou seu ápice e bilhões de reais foram roubados
do Tesouro, no maior desvio de recursos públicos da história da humanidade. Os
que denunciavam a pilhagem do Estado eram considerados enragés. Não
foi nada fácil remar contra a corrente e enfrentar a violência governamental e
de seus asseclas. Como em outros momentos da nossa história, já está chegando o
dia de o passado ser reescrito. Muitos dos que se locupletaram vão se travestir
em adversários ferrenhos do lulismo. Haja hipocrisia.
Vivemos a
crise mais profunda dos últimos 60 anos. Em 1954, tudo acabou sendo resolvido
em menos de três semanas, entre o atentado da Rua Tonelero (5 de agosto) e o
suicídio de Getúlio Vargas (24 de agosto). No ano seguinte, em novembro, o país
teve três presidentes, mas a crise foi logo solucionada. Em 1961, a renúncia de
Jânio Quadros — que quase arrastou o Brasil a uma guerra civil — foi
solucionada em duas semanas, com a posse de João Goulart, a 7 de setembro. Três
anos depois, o mesmo se repetiu, e a 11 de abril, com a eleição de Castelo
Branco pelo Congresso Nacional, foi resolvido o impasse político. Em 1992, o
momento de crise mais profunda ficou restrito a três meses, entre julho a
setembro, quando a Câmara autorizou a abertura do processo de impeachment do
presidente Fernando Collor.
A crise
atual é mais complexa — e mais longa. No tempo poderia ter uma data: a vitória
de Eduardo Cunha, a 1º de fevereiro. A candidatura Arlindo Chinaglia empurrou
Cunha para os braços da oposição — até então muito fragilizada, mesmo após o
excelente resultado obtido no segundo turno por Aécio Neves. As revelações
diárias sobre a extensão do petrolão ampliaram a crise, pois estabeleceu
conexão entre o escândalo, as lideranças históricas do partido e o
financiamento eleitoral, inclusive da campanha presidencial de 2014, em que
propina virou doação legal.
As novas
delações premiadas vão complicar ainda mais o cenário. Prováveis acusados estão,
preventivamente, buscando mecanismos para garantir o foro privilegiado, temendo
serem presos. E a instalação das CPIs do BNDES e dos fundos de pensão vão ter
de devassar as relações do projeto criminoso de poder com a burguesia petista,
aquela do capital alheio, do nosso capital, entenda-se.
O
aprofundamento da crise econômica — com dados que tinham sido escondidos pelo
governo, especialmente durante a última campanha eleitoral —, a divisão da base
política congressual — inclusive de partidos que tem presença no governo, como
a PDT e PTB —, as sucessivas derrotas em votações no Congresso relacionadas ao
ajuste fiscal, a impopularidade recorde de Dilma, o desespero do PT, e o
esfarelamento da liderança de Lula sinalizam claramente que não há mais governo.
O que é bom e ruim. Ruim, pois este projeto de poder fará de tudo para
permanecer saqueando o Estado; bom, porque os brasileiros romperam o feitiço de
mais de uma década e, finalmente, entenderam o mal representado pelo lulismo.
Na última
quinta-feira, era esperado que o PT reconhecesse os erros e apontasse para
alguma proposta de negociação, de diálogo com a oposição. E mais, que buscasse
apoio dos 71% de brasileiros que consideram o governo ruim ou péssimo. Não o
fez. Satanizou a oposição. Associou 1964 a 2015. Tachou a oposição de golpista.
Ironizou os protestos. Conservou a política do conflito, do nós contra eles.
Isso quando estão isolados e sem nenhuma perspectiva, mesmo a curto prazo, de
que poderão reconstruir sua base política.
A
gravidade do momento e o autismo governamental obrigaram as oposições a se
mexer. A necessidade de encontrar uma rápida saída constitucional para a crise
é evidente. A sociedade civil pressiona. As manifestações do próximo dia 16 vão
elevar a temperatura política. Quanto mais tempo permanecer o impasse, pior
para o Brasil. Se 2015 já está perdido, corremos o sério risco de perdermos
2016 e 2017.
É
inegável que Lula e o PT já estão de mudança para o museu da história
brasileira. Mais precisamente para a ala dos horrores — que é vasta. Será
necessário reservar um espaço considerável. Afinal, nunca na nossa história um
projeto político foi tão nefasto como o do lulismo.
(Marco Antonio Villa / Fonte: O Globo)
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